quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Silêncio necessário

Imagine que você, esteja diante da leitura de um bom livro. E que este livro o satisfaça permanentemente com as imaginações e detalhes. Ou mistérios.

Ah, os livros de mistérios... sempre cativam o leitor por alguma coisa a ser desvendada ou que necessita ser trabalhada principalmente pelo leitor em si. O leitor passa a travar um emaranhando de situações em que o mistério o conduz por tudo quanto é tipo de pensamento. Será que vai dar certo? Será que não dará? Foi ela mesmo? Não foi?

O mestre brasileiro de toda esta situação é o nosso bom e velho Machado de Assis. Um escritor fantástico cujas palavras ecoam nos ouvidos estudantis até os dias de hoje, e sua escrita, característica do século XIX, demonstra a maestria de sua criatividade.
Digo especificamente do livro Dom Casmurro. Sua trama misteriosa, cai em um dos maiores mistérios da literatura brasileira: Capitu é ou não adúltera? Ou: Dom Casmurro é ou não "galhado"?

Tal mistério produz fantásticos projetos educacionais pelos professores de literatura ao longo de nosso Brasil. É comum que ouçamos professores que fazem o julgamento de Capitu, como forma receber as informações dos alunos de que tudo realmente foi interpretado e que, como leitores, alcançaram o tão famoso mistério: vasculharam as provas e o uníssono discurso apresentado pelo sofrido personagem principal. E todos, quando lemos, saímos com o questionamento: chifrou ou não?

Em minha humilde opinião, o mistério não está nisso: assemelho o livro à um amigo que nos conta a informação e, misteriosamente ou por proximidade, acreditamos ser verdadeira. Mas realmente é? Eis a genialidade de Assis.

Agora, imaginem que em uma conferência, ( talvez espírita, quem sabe...) colocássemos Machado de Assis como principal conferencista. E fosse direcionado uma pergunta se Capitu é ou não adúltera. E que, por um acaso, a resposta pudesse aparecer. E ai? Quantos professores iriam gostar dessa situação?

O mistério está no silêncio de Machado. Em soltar a informação e não revelar. Deixar o leitor elaborar por si. Esse é o alvo a ser atingido.

Mas nem sempre isso ocorre. Recordemos do caso de nossa tão amada J. K. Rowling que em 2007 fez uma revelação que surpreendeu muitos leitores. E que quebrou um silêncio tremendo. Dizer que Dumbledore, o diretor da Escola de Hogwarts era gay, foi um tanto quanto desnecessário.

Jamais trataria pelo lado sexual, mas sim pelo lado "leitura". Não estou julgando o caso: gay ou não, mas sim, "isso está no livro (e/ou) vai mudar alguma coisa na obra (e/ou) a escritora esqueceu de escrever?" Todos os escritores escrevem um livro para que os leitores criem suas opiniões pessoalmente. Não está no livro? Então não ocorreu.

A obra deve falar por si. Se o autor precisa explicar o que ocorre no livro, mesmo depois de ser um estouro de vendas, é invadir a privacidade dos pensamentos dos leitores. E dizer que a obra em si é incompleta. E que precisa de algo além de suas letras.

Boas leituras são completas por si só. Não dependem de ninguém falar nada. Não dependem de autores lerem por nós. Dependem de nossas leituras.

O silêncio do autor é necessário: mantém a obra pela obra. Invadir a interpretação dos leitores é um erro brusco. E Machado de Assis, nesse quesito, está muito a frente de milhões de dóllares.