segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Reforma à sombra de uma peneira

Cultura é tipicamente uma coisa que caracteriza os usos e costumes de uma determinada região ou povo. Nada que esta seja a melhor definição para tal, porém, não podemos dizer que não seja ao menos parte de um significado maior.

Se formos nos basear a estes termos, podemos ver que este tipo de coisa provavelmente venha justamente a tocar em algo que é do nosso interesse. Pode até ser que não, mas no nosso bairro, na nossa própria casa, estamos envoltos em algo que é nosso, que é costumeiro, que é cultural.

Não sendo diferente, todo esse conjunto de diferenças, que tornam pessoas cada vez mais próximas, existe uma composição maior pela qual podemos observar que um país se pauta para dizer: isso é da minha terra.

Porém não estou aqui para discutir danças ou ritos de passagem. Estou aqui para discutir uma das situações mais delicadas do nosso dia-a-dia: nossa queridíssima língua.

Vinda de caravela da Europa, o português ( a língua e o povo, que coincidentemente tem o mesmo nome da língua) vem com sua característica latina, como a última flor de lácio. Pois lho é: somente 7 países no mundo utilizam a língua portuguesa. E pra não ser diferente, cada lugar acabou adaptando tal língua conforme os usos e costumes de seu espaço.

Como nossas professoras dizem, o português brasileiro vem da mistura de línguas africanas com línguas indígenas. Daí vem o nosso sotaque menos carregado, mais pausado, mais "audível" que o português original.

Tanto o é que identificamos rapidamente quando um português de Portugal está falando e quando um brasileiro está a falar. A utilização de consoantes e pronomes do caso reto e oblíquo são evidentemente diferentes.

E respeitamos. Assim como respeitamos o "carioquês" com RRRRRRrrrr´s e XXXXXXXXSss´s extremos. Assim como respeitamos o sataque gaúcho ou mesmo o sotaque nordestino, são adaptações linguísticas que demosntram claramente a limitação cultural de cada espaço geográfico-humano.

Não temos como escapar disso, e ficar de observador. Moro em uma região que o arrrrr é mais quente e que as vezes eu tenho que fecharrrrrrrrr a porrrrrrrrrrta. Então não saio do contexto cultural.

De repente, fomos bombardeados paulatinamente com informações de uma reforma ortográfica fantástica. Quando recebi pela primeira vez, achei tudo engraçado, pensei pessoalmente que seria uma grande "pegadinha do mallandro". Fui conversando aos poucos com os professores de português, e eles aos poucos foram confirmando: É verdade. Vai mudar.

Para quem tem curiosidade, a lista apresneta algumas modificações um tanto quanto interessantes, tal como ser antiético perante uma assembleia. Assim como vai ser ótimo para os portugueses economizarem caneta e deixarem de escrever óptimo.

Assim, todos os países lusófonos podem se intercomunicar por igual. Ah, que beleza! Finalmente uma modificação que vai fazer realmente o mundo mudar! Como eles não descobriram isso antes?

A situaçao é ampliar a intercomunicação entre os países africanos e portugueses.
Mas pera lá: se a base linguística é o português, por que modificar?

A situação mais parece que queremos que a lingua não desapareça de suas origens e as editodas possam comunicar-se ou vender livros para outros países. Assim todo mundo lê o que é em português.

Mas pera lá: não seria a nossa língua portuguesa uma adaptação cultural? E não seria o português de angola uma adaptação cultural? Não seria o português de Portugal a sua fonte e necessidade de expressão cultural? Por que modificar?

Na verdade estamos perdendo o respeito que há pela cultura alheia e preferimos dizer que está tudo certo se impormos regras culturais. Se a proposta é unificar a língua, por que não unificamos a cultura de uma vez?

Por que não adquirimos a cultura gaúcha e fazemos com que todos os brasileiros tomem chimarrão? Assim ficaria bem mais fácil, as empresas de erva-mate agradeceriam! Aliás, por que não espalhar essa nova imposição cultural para outros países? Principalmente os lusófonos?

Por que não impor a condição cultural lusitana para os países da língua portuguesa, fazendo com que todos passem a cantar fados mundo afora?

Machucaria cada espaço né? Ah machucaria, pois usos e costumes são extremamente dificultosos de se mudar.

Tomemos como exemplo a diferença linguística entre americanos e britânicos. Para quem faz um curso de inglês sabe que a diferença é berrante. Na grafia, Color e Colour são totalmente diferente assim como são marcas culturais tão fortes quanto center e centre. Por que não se faz uma modificação cultural por lá também?

A grande questão é que gostamos de tapar o sol com a peneira e achar que estamos com bastante sombra. Gostamos de falar que modificamos a lingua portuguesa para intercomunicarmos melhor com os países lusófonos e eles conosco. E quando adentramos  no Brasil, vemos que isso não melhorou a educação, não transformou nossas escolas e o português da boca dos brasileiros, continua se adaptando propriamente, sem regras ou imposições.

Assim como exigimos modificações, essa sombra peneirística que nos cobre não está em regras ortográficas: está no modus operandi educacional. Assim, deixaríamos de acreditar que somos melhores por regras novas.

Continuamos a acreditar que nosso país só tem uma cultura, assim como todos os países lusófonos tiveram uma mesma adaptabilidade cultural à imposição linguística lusitana. Desrespeitamos a cultura do outro com motivo de uma ampliação de diálogos. Quem dera nossos queridos linguistas que tanto lutaram por uma nova ortografia, não fizessem modificações que em sala de aula apresentemos as diferentes formas de escrita do português em seus diversos países? Preferimos criar indivíduos que enxergam apenas um pequeno mundo, de uma regra única, a transformá-los em poliglotas de uma mesma lingua. De diversas culturas. De diversos costumes. Num país multicultural e multilinguístico. Isso sim seria ampliação de diálogos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário