domingo, 22 de novembro de 2009

Leitura imposta

Recordo-me dos meus tempos de vestibulando( que coisa mais retrô né?) que todas as vezes que eu vasculhava uma universidade pela qual eu teria interesse em prestar um vestiba, o que eu mais tinha medo era justamente a listagem de livros. Uma lista enorme de livros, cuja a familiaridade era totalmente longínqua.


Mas tinha que ler, porque com certeza no quesito literatura a saída era justamente saber o que se passa na obra. Então, passava eu pela biblioteca municipal e vasculhava o que tinah e o que não tinha. Quando não tinha, já deixava bem claro para que eu passasse novamente na biblioteca em outro dia para poder pegá-lo.

E lá ia eu nessa luta vestibulanda, de conseguir ler todos os livros sem medo de ser feliz. E apesar de tempo de vestibulando ser contado em segundos, entre estudos e matérias, a leitura ficava pros momentos de folga.

Para mim, como esse tipo de leitura começou justamente no período do Ensino Médio, a leitura era massante e cansativa. Mas tinha que fazê-la, pois o vestibular exigia.

Assim é que costumamos ler: por obrigação. Assim que comecei a ler. Mas nada foi mais interessante que o período universitário, quando por um acaso resolvi ler Machado de Assis, em sua obra Dom Casmurro. Me sentia atrasado por se tratar justamente de uma literatura própria do ensino médio. Mas não custava nada, baixei o livro e comecei.

Não foi espantosa a descoberta que tive ao ver que o livro, que na época de vestibulando era massante, no período universitário foi excelente. A leitura foi prazerosa. E sem que qualquer pessoa me disesse o que viria a acontecer no enredo. Embarquei e pensei comigo, que livro!

E realmente é um livro fantástico. Extremamente chamativo quanto à sua forma de atrair o leitor para uma causa misteriosa. Própria da sociedade dos fins do século XIX. Enxergava detalhe a detalhe qual era a famosa trama.

Mas o que mais me doía era o meu sentimento de atrasado. De me sentir fora do tempo, lendo um livro de vestibular, quando a minha literatura obrigatória era baseada na historiografia.

Desde então passei a indagar: Será que era eu quem estava atrasado ou a forma de imposição de leitura com a qual tive que me adaptar?

Apesar de minha prática de leitura ser tardia, por eu achar massante, a leitura imposta para mim não me ensinou a ler livros. Me ensinou a ter disciplina perante uma atividade futura, vestibular, prova do livro e relatório ou fichamento. Mas não a ler um livro.

Por um outro lado, aprendi a ler pelo fato de eu entrar em corredores de livros na biblioteca de minha faculdade e procurar livros que me chamassem a atenção. E um após o outro, criei um hábito que até então não tinha adquirido, sem qualquer obrigação.

Hoje, a leitura é uma entre tantas atividades que temos no nosso cotidiano - entre trabalho e estudo, sempre um tempo para a leitura. Infelizmente vivemos numa sociedade em que não se ensina a ler - obriga-se a ler e ponto.


A obrigatoriedade tanto a mim imposta, não fez de mim um leitor, como a gente insiste em acreditar que faz. Ler Machado de Assis depois do período dos vestibulares, não foi um sentido de atraso, mas de descoberta. O meu atraso por poder extrair informações que eu não conseguia extrair não foi o excesso de tempo para a leitura, e sim, descobrir o que é ler.

Se tudo isso não fosse apenas um problema meu, não teríamos tantos estudantes correndo atrás de resumos e livros em áudio. Virou moda entre vestibulandos. E desde que vemos tudo isso acontecer, ainda  acreditamos que impor um monte de livros torna o Brasil um país de leitores.

E Machado de Assis, Saint Exupery, J.K. Rowling são mais adultos do que imaginamos. A forma de se ensinar a ler no Brasil que ainda é infantil. 

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